26.12.07

Confissão

Sempre achei legal dizer para as pessoas que não imaginava aquilo que elas estavam sentindo ou passando em um determinado momento. Para mim, isso era uma maneira de ser consciente do problema alheio, já que, como não era comigo, seria impossível saber ou sentir algo parecido.

Continuo dizendo isso e pensando dessa forma, no entanto, percebi que essa maneira de agir pode simplesmente revelar o quanto medíocre eu posso ser. Não num sentido ruim da palavra – se é que isso é possível -, mas essa conduta pode expor que não vivi muita coisa para saber como é estar “naquela” situação. Seria uma ausência de sentimentos e emoções, um vazio, e não uma técnica psicológica avançada, como sempre achei.

Óbvio que tenho algumas ressalvas comigo mesmo quanto a essa conclusão, mas não posso deixar de levá-la em consideração. Confesso que não concordo totalmente com ela, e fico brigando com meus pensamentos o tempo todo por conta disso. Só que, por outro lado, também não posso ignorar a possibilidade de ser a mais pura verdade.

O “não imagino” para mim sempre teve um significado muito grande de compreensão ao problema daquela pessoa. Quando estou puto com alguma coisa, a última coisa que quero ouvir é “ah, eu sei como é”. Mentira. Ninguém sabe como é aquilo que você está passando, porque as pessoas são diferentes, na essência e culturalmente falando.

E é justamente aqui que minha tese, ao lado da antítese, se encontra. Penso dessa forma porque isso realmente é verdade ou é uma falha de formação sentimental única e exclusivamente minha?

Para cada ocasião/problema/vitória/derrota existe uma reação. E ela nunca é igual. Cada um reage a sua maneira, expondo uma série de variáveis que constituem aquela pessoa como ser humano.

Diante disso, e viagens à parte, vou continuar dizendo “não imagino” para as pessoas, porém, sempre que o fizer, ficarei com a pulga atrás da orelha.

19.12.07

Carta

Se não me falha a memória, eu tinha sete anos na época. Lembro-me de ter acordado muito, muito cedo, por volta das 5 horas da manhã. Acho que era a primeira vez que saía da cama naquela hora. Apesar de achar a novidade boa, no início foi difícil vencer o sono. Com certeza – apesar de não ter muito claro na memória – devo ter tirado um cochilo no caminho, já que o destino era bem longe.

Em determinada altura do caminho, lembro dela servindo Nescafé em uma daquelas garrafas térmicas coloridas. Eu nunca gostei da bebida, mas o marido dela sempre a bebera. Durante o trajeto, na cabine do caminhão, tudo correu bem. Ela, como sempre, tinha o sorriso fácil e era muito falante. Confesso que não recordo os assuntos, mas foram poucos os momentos de silêncio.

Estávamos na estrada quando, ao longe, deu para ver que um cachorro havia sido atropelado. Ao passamos próximo, ela virou o rosto, porque não agüentava ver aquela cena.

Esta viagem foi para Itu e até hoje lembro como uma das coisas mais legais que fiz na infância.

Entre tantas outras passagens, lembro-me dela na praia também. Eu, muito mais novo do que sou agora e começando a pegar onda, só tinha um pensamento naquela época: estar na praia, não importava como.

Quantas vezes chegava à casa dela em Boracéia, sem avisar, e era bem acolhido. O fato de ficar o dia inteiro pegando onda dava uma fome fora das proporções normais. Sempre que voltava para a casa, lá estava algo para eu – e quem mais estivesse comigo – comer. Tudo pronto e muito bem feito, ainda que o tempero e a forma de preparo fossem bem diferentes da comida que minha mãe fazia. No entanto, não sei exatamente se pela novidade no sabor ou pela fome mesmo, comia muito e de tudo um pouco.

Sei que poderia descrever muitas outras passagens com ela. No entanto, essas duas ocasiões servem perfeitamente para explicar um pouco o seu jeito, sempre sorrindo.

Infelizmente nunca mais verei essa cena, pelo menos não presencialmente, já que ela se foi. No entanto, tenho certeza que essa imagem jamais será apagada das minhas lembranças, assim como aquela viagem para Itu.

E – peço desculpas para aqueles mais próximos – é exatamente esse sorriso e a aura de felicidade que quero ter para sempre na memória, por isso não estou presente no último adeus.

3.12.07

Não sei

Tornar um sofrimento público é uma tentiva de amenizá-lo?

Roteiro de roliúde

Você sabia que as probabilidades de dar certo eram pequenas. Aliás, essa certeza caiu desde o primeiro momento em que você a viu, marcado por uma luz incrível sob seu rosto, cuja intensidade teve o mesmo efeito de quando você vê alguma coisa pela primeira vez. O sentimento de incredulidade diante da situação toma conta de você, porque aquilo é surreal demais para estar acontecendo. Não era a primeira vez que você a via, no entanto, naquele momento, você nunca tinha visto nada tão lindo.

Daí, as certezas do início foram caindo uma após a outra conforme você ia convivendo com ela. Até as coisas consideradas mais bregas – opinião sua, não dela -, tinham uma roupagem completamente diferente e era ótimo fazê-las, exatamente como manda o manual de relacionamentos da época da sua avó. Clichê? Piegas? Manjado? Quem se importa quando a mulher da sua vida está ali e tudo o que você quer é fazê-la feliz.

Assim como muitas coisas na vida, essa também não tem explicação. Você a ama e sabe que ela sente algo por você – mesmo que não seja na mesma intensidade ou da mesma forma. Apesar de tudo isso, as coisas não saem como manda o manual, o mesmo dos atos/frases/sentimentos clichês. Daí, quando você se dá conta disso, começa uma busca incessante por respostas e auto-avaliações com o objetivo de descobrir o que está errado. A esperança de salvar tudo e levar o relacionamento adiante é o sentimento mais presente.

Depois de tudo isso, você acorda e lembra que não a terá mais do seu lado, por mais que o sentimento seja exatamente o mesmo do dia anterior, em que tudo acabou, sem tirar nem pôr uma vírgula. O mais torturante é que junto desse aperto no coração, você sente certo alívio – se é que pode ser chamado assim – de que para ela essa é a melhor solução.

O fim para você fica com o gosto de decepção e de ter falhado. Mas, para ela, pelo menos é esse o pensamento que te consola, a situação representa o recomeço, já que finalmente ela está livre para encontrar o seu príncipe encantado, como sonha desde criancinha. Recorrendo mais uma vez ao manual, por ignorância nesses assuntos, você descobre que seu jeito e o modo de agir e pensar representam o anti-herói retratado nesses antigos manuais.

Ainda que em muitos roteiros de filmes, as mocinhas se apaixonem pelo vilão, no final, elas acabam ficando com o mocinho, porque descobrem que é realmente tudo o que desejaram, desde quando brincavam de casinha.

Ao vilão, que não tem nada de vítima nessa história toda, resta o vazio com o qual ele já está mais do que acostumado. Só que pensando em tudo o que aconteceu, ele percebe que faria tudo novamente por ela, mas somente por ela.

30.10.07

Encontro marcado (grand finale)

Essa história já deveria ter terminado faz tempo, afinal ninguém lembra mais que a maior autoridade católica esteve em terras tupiniquins há poucos meses. Mas ninguém dá a mínima para isso né? De qualquer maneira, vamos lá.

O segundo tiro, enquanto os seguranças e o algoz de Bento XVI brigavam no chão, atingiu um colega que também havia sido convidado para o encontro. Ele viera da Bahia e era evangélico fervoroso, devoto de um deus chamado Edir Macedo. Quando percebeu que a bala o atingiu, só deu tempo de dizer “me ajud . . .”.

Em meio à confusão criada e o corre-corre de pedestres e curiosos, alguém teve a brilhante idéia de ligar para uma ambulância. Enquanto os médicos não chegavam, a multidão começou a se aglomerar para ver o que tinha acontecido com aquele homem, sem saber quem era.

Por uma força divina ou falta de preparo do assaltante, o tiro não acertou em cheio a testa do pontífice. Olhando com mais atenção, todos perceberam que a bala, apesar de tê-lo atingido, não havia feito muitos estragos. No entanto, sem muita explicação lógica, Bento XVI perdia muito sangue com o ferimento.

Quis o destino ou não – se que você me entende – que um médico estivesse passando pelo local onde tudo aconteceu bem naquele momento. Quando viu os dois homens no chão feridos, o profissional anjo da guarda – com o perdão da piada – examinou os dois e decretou: o evangélico havia morrido mesmo e o papa ainda tinha chances de sobreviver, caso recebesse o socorro adequado rapidamente.

Durante tudo isso que estava acontecendo, praticamente todo mundo ali já tinha ligado para o resgate, Bombeiros, Polícia Militar e por aí vai. Entretanto, até aquele momento nenhum deles havia chegado, apenas os curiosos - que a cada segundo tinha a quantidade quadruplicada, principalmente quando o comentário geral de que o papa havia sido atingido começou a correr de boca em boca.

Passados dez minutos, nada de ambulância e médicos para prestar socorro ao homem santo. A poça de sangue aumentava de tamanho assustadoramente, e a roupa do médico “passante” já estava totalmente tingida de vermelho. Ele dizia que a situação estava ficando crítica, porque sem os equipamentos necessários não dava para fazer muita coisa para salvá-lo.

Imaginar que uma ambulância chegaria onde estávamos - no centro da cidade, próximo das seis tarde - rápido para salvar alguém, é bem difícil. E foi exatamente isso que aconteceu. Depois de vinte e três minutos, os médicos finalmente apareceram com todo aquele aparato.

Aplicados os primeiros-socorros e os procedimentos básicos para casos como aquele, nada do Bento XVI reagir. Os profissionais ainda tentaram salvá-lo, continuando com aqueles exercícios e esforços que estamos acostumados ver em filmes por uns dez minutos, e nenhuma reação.

A esta altura, todos estavam desanimados e ninguém mais acreditava que o quadro poderia ser revertido. Muitos ali, principalmente as senhoras, começaram a tirar terços das bolsas e rezar o Pai Nosso ininterruptamente. Por mais fé que todos tivessem – não importa fé em quê – nada adiantou. O papa estava morto. E o que é pior: tudo acontecera no Brasil, tido como o maior país católico do mundo.

Como era de se esperar, a comoção tomou conta de todos, nem tanto pela questão religiosa, mas mais pela situação irônica/absurda/surreal ou qualquer outro adjetivo que se enquadre. Mesmo com o veredicto dos paramédicos, ninguém arredou o pé do local. Poucos minutos depois, toda a Imprensa já estava filmando/fotografando/entrevista/ouvindo e especulando o que havia acontecido com o pontífice.

Os desdobramentos do fato são fáceis de adivinhar: comoção pública, choradeira geral, lamentações e secretários de segurança e políticos em geral combatendo – somente nos programas televisivos – a violência que assola as cidades brasileiras.

Algum tempo depois, já com a história meio esquecida pela mídia, divulgou-se um laudo médico que dizia o seguinte: morte por falta de socorro imediato.

Diante disso, a única conclusão possível é que o papa foi só mais uma vítima do trânsito caótico que enfrentamos todos os dias.

10.7.07

Esse merece

Sei que não terminei a história do papa, mas esse merece furar a fila. A lacuna pontífice logo será preenchida.

Eu, etiqueta

Em minha calça está grudado um nome

Que não é meu de batismo ou de cartório

Um nome... estranho

Meu blusão traz lembrete de bebida

Que jamais pus na boca, nessa vida,

Em minha camiseta, a marca de cigarro

Que não fumo, até hoje não fumei.

Minhas meias falam de produtos

Que nunca experimentei

Mas são comunicados a meus pés.

Meu tênis é proclama colorido

De alguma coisa não provada

Por este provador de longa idade.

Meu lenço, meu relógio, meu chaveiro,

Minha gravata e cinto e escova e pente,

Meu copo, minha xícara,

Minha toalha de banho e sabonete,

Meu isso, meu aquilo.

Desde a cabeça ao bico dos sapatos,

São mensagens,

Letras falantes,

Gritos visuais,

Ordens de uso, abuso, reincidências.

Costume, hábito, premência,

Indispensabilidade,

E fazem de mim homem-anúncio itinerante,

Escravo da matéria anunciada.

Estou, estou na moda.

É duro andar na moda, ainda que a moda

Seja negar minha identidade,

Trocá-lo por mil, açambarcando

Todas as marcas registradas,

Todos os logotipos do mercado.

Com que inocência demito-me de ser

Eu que antes era e me sabia

Tão diverso de outros, tão mim mesmo,

Ser pensante sentinte e solitário

Com outros seres diversos e conscientes

De sua humana, invencível condição.

Agora sou anúncio

Ora vulgar ora bizarro.

Em língua nacional ou em qualquer língua

(Qualquer, principalmente.)

E nisto me comprazo, tiro glória

De minha anulação.

Não sou - vê lá - anúncio contratado.

Eu é que mimosamente pago

Para anunciar, para vender

Em bares festas praias pérgulas piscinas,

E bem à vista exibo esta etiqueta

Global no corpo que desiste

De ser veste e sandália de uma essência

Tão viva, independente,

Que moda ou suborno algum a compromete.

Onde terei jogado fora

meu gosto e capacidade de escolher,

Minhas idiossincrasias tão pessoais,

Tão minhas que no rosto se espelhavam

E cada gesto, cada olhar,

Cada vinco da roupa

Sou gravado de forma universal,

Saio da estamparia, não de casa,

Da vitrine me tiram, recolocam,

Objeto pulsante mas objeto

Que se oferece como signo de outros

Objetos estáticos, tarifados.

Por me ostentar assim, tão orgulhoso

De ser não eu, mar artigo industrial,

Peço que meu nome retifiquem.

Já não me convém o título de homem.

Meu nome noco é Coisa.

Eu sou a Coisa, coisamente.

(Carlos Drummond de Andrade)


8.5.07

Encontro marcado II

(Só para voltar ao fio da meada, o papa ia começar a responder a pergunta sobre o divórcio e o segundo casamento, quando a história foi interrompida. Então voltemos).

Antes da resposta do pontífice, vale abrir um parêntese para explicar a situação em que estávamos no bar, da qual esqueci de detalhar antes. Pelo fato de ter escolhido um botequim para o encontro, Bento XVI fez questão de dispensar o aparato milionário de segurança que o acompanhou durante toda a visita ao país e pediu somente dois seguranças. Para não chamar muita a atenção, ele colocou um jeans, tênis, camiseta e boné. Acreditem se quiser, mas a figura do papa vestido assim ficou bem bizarra.

Sobre a “praga” do divórcio e do segundo casamento, Ele começou explicando que foi mal interpretado e que a tradução para o português não foi muito feliz. Apesar disso, o papa começou o discurso baseado em valores cristãos para explicar os motivos pelos quais criticou a separação e uma nova união de pessoas que foram casadas anteriormente.

Ele explicou que aos olhos da Igreja não existe separação, porque quando o casal é abençoado pelo padre no altar no momento das juras e promessas de amor e companheirismo eternos, a união não pode ser desfeita aos olhos de Deus. Obviamente que a minha carência em formação católica está fazendo para detalhar melhor tudo o que falou sobre isso, mas em resumo a idéia e os argumentos foram esses.

Mesmo com a explicação convincente, a maioria daqueles que estava ali naquela mesa de bar apresentou contra argumentos e a discussão estava travada. A serenidade e seriedade do papa eram incríveis. Ele não mudava de expressão nem mesmo quando alguém fazia um ataque mais forte contra a opinião apresentada.

O assunto continuou até que outra questão polêmica apareceu: a camisinha. Todo mundo já sabia qual era a posição da Igreja diante disso, então a conversa caminhou para um sentido mais de rever os conceitos e não simplesmente explicá-los. Ele afirmou que era praticamente impossível estimular ou ao menos deixar de condenar o uso do preservativo.

Os ensinamentos do catolicismo dizem que o sexo deve ser feito somente para fins de reprodução, daí a camisinha não teria nenhuma serventia. Mesmo o assunto sendo batido, alguém falou sobre a Aids e outras doenças sexualmente transmissíveis, e a resposta a mais conhecida do mundo: abstinência.

Apesar dos ânimos exaltados de ambos os lados, a conversa estava caminhando para o final quando um homem vestindo um sobretudo preto aproximou-se da mesa em que estávamos. Do nada, o cara tirou uma arma da cintura e anunciou o assalto, apontando a arma para o papa.

Neste instante, o pontífice foi pegar alguma coisa no bolso. O homem armado se assustou e atirou, atingindo Bento XVI bem no meio da testa. Automaticamente os seguranças agarraram o homem enquanto todos assistiam àquela cena em estado de choque.

Os três continuavam brigando quando ouviu-se mais um tiro.

Continua . . .

3.5.07

O encontro

No início eu não acreditei que seria possível. Eu, justamente uma das pessoas mais confusas em relação à fé e declaradamente não muito simpático aos “ensinamentos” da Igreja Católica, fui escolhido para encontrar com Ele. Não estou me referindo a Deus, apesar de ter escrito em caixa alta, mas sim ao cardeal Joseph Ratzinger, agora chamado de papa Bento XVI.

A coisa aconteceu mais ou menos assim.

Aproveitando a vinda do pontífice ao Brasil e a vontade de ele estabelecer um diálogo com os moradores de um dos países mais católicos do mundo, algumas pessoas foram selecionadas aleatoriamente para encontrar com o presidente do Vaticano pessoalmente. Dentre os felizardos, este que vos escreve.

Quando soube da notícia argumentei que não era católico, muito menos tinha intenção de conhecer o papa. Porém, os organizadores explicaram que, assim como eu, os escolhidos tinham credos diferentes e era justamente este o objetivo: colocar pessoas com visões diferentes para debater a fé atualmente.

Mesmo desconfiado e com ressalvas, acabei aceitando o convite e confirmei minha presença ao evento. Para não intimidar aqueles que não seguem as doutrinas pregadas por Bento XVI, escolheu-se um local neutro para o encontro, ainda que o pontífice fizesse questão de realizá-lo no mosteiro de São Bento, onde está hospedado.

Por mais surreal que possa parecer, vossa santidade topou encontrar-se com o seleto grupo em um bar qualquer de São Paulo para que todos pudessem conversar enquanto bebericávamos alguma coisa – cerveja para os pobres mortais e o sangue de Jesus, vulgo vinho para os padres, para o pontífice.

Mais surreal ainda foi ver o papa fazendo os pedidos ao garçom em claro e bom português. Além do vinho, ele também pediu uma porção de amendoim (!) e outra de queijos. Nós, os outros, entre olhares desconfiados e incrédulos nos sentimos estimulados a provar a cozinha do local e foi um festival de porções, com direito a carne de sol com macaxeira, feijão de corda, mocotó e outras iguarias tupiniquins – bem diferentes da alta gastronomia da qual Bento XVI está acostumado, inclusive os mimos aqui no Brasil.

Mesa cheia, e a conversa começou em tom ameno, com basicamente apresentações de todos, menos Dele, por motivos óbvios. Em seguida, alguém já entrou com os dois pés no peito: jogou na roda o assunto do divórcio e do segundo casamento, ambos condenados pelo papa.

Um longo silêncio antes da resposta e Ele resolveu falar.

Continua . . .

2.5.07

Devaneios

Não, a mentira não é melhor caminho, mesmo quando ela parece ser o único

Sim, por mais indiferentes que as mulheres possam parecer em determinadas situações, elas continuam adorando flores, homens carinhosos e palavras gentis

Não, praticar esportes frequentemente e ter uma alimentação balanceada a vida inteira, não garante que você vai viver 200 anos

Sim, sempre que as pessoas morrem, por pior que elas tenham sido, tornam-se boas

Não, as pessoas não imaginam o que está acontecendo quando você conta um problema a elas

Sim, o trabalho dignifica o homem, mas também o estressa, cansa, frustra . . .

Não, o jornalismo não é o glamour que a maioria das pessoas pensam que é

Sim, a fé, seja ela qual for, não tem explicação, portanto, respeite qualquer manifestação dela

Não, por mais que você tente explicar, o rock não é mais legal do que o pagode, é apenas uma questão de gosto, igual acontece com bundas . . .

Sim, ninguém faz nada de graça, mesmo que seja apenas para massagear o ego

Talvez, os blogs na internet sirvam apenas para escrevermos sem pensar muito e tornar público as maiores besteiras que pensamos e nunca teríamos coragem de falar pessoalmente ou para um público.

21.3.07

Momento inspirador

Frase proferida durante uma conversa via msn:

o único problema de tamanha relatividade é a falta de respeito em relação à diversidade resultante dessa relatividade.

Não sei exatamente o que quis dizer com isso, mas ficou bonita pelo menos . . .

14.3.07

Desta vez . . .

. . . não é preguiça mesmo. É apenas uma constatação daquela frase de que a realidade é sempre muito pior do que a ficção.

Mulher morre após pacto com amante que conheceu pela internet

A taquígrafa Maria Aparecida Lima da Silva, 38, morreu em Brasília após tomar veneno de rato. Segundo a Polícia Civil, ela havia firmado um pacto de morte com seu amante, Kléber Ferreira Gusmão Ferraz, que não cumpriu sua parte no acordo e acabou preso. O caso aconteceu no último dia 5, mas só foi divulgado hoje.

Silva e Ferraz haviam se conhecido no início de 2006 no site de relacionamentos Orkut e iniciaram o namoro. Segundo a Polícia Civil do Distrito Federal, Ferraz era casado e dizia para a amante ser judeu e agente secreto a serviço do governo de Israel, para não ter que revelar detalhes de sua vida. Ele acabou preso por induzir a taquígrafa ao suicídio.

No último dia 5, depois que o duplo suicídio estava acertado, o casal alugou um quarto no hotel Bay Park, mas apenas Silva tomou o veneno. Quando ela foi encontrada morta, Ferraz não estava mais no hotel, mas acabou preso no mesmo dia.

Durante o tempo em que permaneceram juntos, Silva pagou várias despesas de Ferraz, inclusive de sua mulher e seus filhos. Segundo a polícia, ela havia comprado um carro para ele.

Antes de se matar, a taquígrafa havia descoberto que Ferraz era casado, mas mesmo assim manteve o relacionamento. De acordo com a Polícia Civil, a família dela também já havia tentado, sem sucesso, fazê-la desistir do relacionamento.

Folha On-line 14/03/2007

8.3.07

O dia delas

Nunca fui um grande fã de datas comemorativas. Sempre tento olhar de fora da excitação pela qual a maioria das pessoas passam nos dias em que se comemora alguma coisa. Hoje, Dia Internacional da Mulher, além dessa postura descrita, olho a data de "fora" por motivos óbvios. O fato de eu gostar ou não destas datas pouco importa, já que não mudo a vida de ninguém por conta disso. Agora muitas empresas que "gostam" disso, acabam piorando muito as coisas.

A Folha de S. Paulo lançou um "caderno especial" Mulher com textos e opiniões criticando a chamada ditadura da moda, porque outras questões envolvendo as mulheres (violência doméstica, descriminalização do aborto e dupla jornada de trabalho) são coisas ultrapassadas e, como o jornal dá a entender, não são mais problemas enfrentados por nenhuma brasileira. Até aí tudo bem, ou não né meninas?

Mas o que mais chamou a atenção são os anúncios do caderno. Logo na capa, meia página de propaganda de lavadora de roupas, lava-louças, lavadora "tira-manchas" e um microondas com sexto sentido - referência ótima neste caso. Nas páginas seguintes do suplemento o show de anúncios continua.

Em um deles, de um creme de rejuvenecimento, a frase "Hoje a mulher merece ficar mais tempo na frente do espelho". E para coroar o show de horrores na última página, uma construtora reproduziu a imagem de uma casa construída com alguns objetos que supostamente lembram as mulheres: sapato, jóias, óculos, batom, perfume, bolsa, carteira e por aí vai.

Não entendo nada de propaganda, mas colocar anúncios com tamanho grau de pré-conceitos em um caderno destinado a mulheres não deve funcionar muito bem para essas empresas. Pelo menos, aquelas que forem conscientes e que de fato brigam por espaço numa sociedade cada vez mais machista, não devem se sentir nem um pouco homenageadas dessa maneira.

Assim como não gosto de datas comemorativas, também nunca entro em polêmicas discutindo a igualdade entre homens e mulheres (apesar de achar que a sociedade não as trata da maneira como deveria) ou com os argentinos - aliás essa é uma das coisas que vou morrer sem entender o porque dessa rivalidade besta.

Apesar disso, não imagino (porque não existe imaginar uma situação pela qual você nunca passou ou não passa diariamente) como deve ser mulher e os desafios que elas são obrigadas a enfrentar. Da mesma maneira que não imagino como é ser negro em um país onde esta raça é maioria e ainda assim há um preconceito velado imenso.

Como é impossível me colocar no lugar de qualquer pessoa, seja um negro ou um grande empresário de uma multinacional, respeito todo mundo independentemente das características físicas, cor da pele, credo, gosto e etc. Obviamente que tenho minhas preferências pessoas e naturalmente vou me entender melhor com pessoais que tenham determinadas preferências, mas isso não quer dizer que os demais sejam menores.

Sei que falei demais até aqui e nem tudo parece fazer sentido, mas de uma maneira ou outra é uma forma de homenagem às mulheres, mesmo não gostando de datas comemorativas.

2.3.07

Contra-cultura

Muitas vezes fico pensando o tamanho da influência de empresas privadas na imprensa “grande” brasileira. Não sou mais ingênuo de acreditar que existe jornal livre, porém, não dá para medir exatamente até onde vai essa dependência. Infelizmente, nessa semana tive mais uma prova do quão promíscua pode ser essa relação.

Obviamente que todo mundo viu ou ouvir falar sobre a exposição de obras criadas por Leonardo Da Vinci, no Oca, no Parque do Ibirapuera. Na verdade, as pessoas devem estar até cansadas de tanto ver matérias sobre isso. Só que, curiosamente, no dia anterior à abertura ao público, essa exposição ganhou capa dos cadernos culturais dos dois maiores jornais de São Paulo: Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo.

Claro que a notícia é relevante e merece ser divulgada para o maior número de pessoas possível. Mas, neste mesmo dia, a Globo também entrou com um link no SPTV primeira edição direto do Ibirapuera. Levando em consideração a data da abertura e tudo o mais, aquele dia era o ideal para a cobertura, mas é impossível não imaginar que houve um “trabalho” muito forte de marketing da empresa patrocinadora – Bradesco.

Nada contra empresas privadas “patrocinarem” a “arte”. O que me chamou a atenção foi o tamanho da devoção da imprensa em relação ao fato. Devoção porque parece que só tinha isso acontecendo em São Paulo, e para ajudar eles ainda faziam uma cobertura “casada” com outra exposição na Oca: Corpo Humano. Com um “apoio educacional” adivinha de quem? Fundação Bradesco.

Eu sei que esses posts podem parecer um bairrismo da minha parte, já que sou jornalista e teoricamente tenho como “função moral” criticar e querer uma imprensa de qualidade. Mas é impossível não perceber a relação que se estabeleceu entre a mídia e os ditos produtores de cultura do país. Isto porque são duas exposições para públicos abonados – o ingresso custa R$ 30 para cada uma.

Que a situação do jornalismo cultural praticado por grandes veículos de comunicação é triste, todo mundo sabe. Mas quando vejo coisas assim desanimo de querer escrever alguma coisa sobre cultura profissionalmente. Nunca trabalhei nesta área, mas a impressão é que uma certa independência é impossível, porque as ações de marketing dos patrocinadores engolem qualquer crítica “mal-vinda”.

Não que isso não ocorra em outras coberturas, como a política ou econômica, por exemplo. Mas quando acontece isso com a cultura é uma contradição muito grande – o avesso daquilo que a “boa” arte prega.

27.2.07

Desta vez . . .

. . . não é preguiça intelectual. Estou colando outro texto aqui porque é infinitamente melhor do que qualquer coisa que eu tentasse escrever. É do Fernando Bonassi e fala sobre o Oscar.

É preciso remar contra essa onda das estátuas!

Para desafinar o coro dos babacas, é preciso remar contra a onda das estátuas!
Nunca é demais lembrar aquele velho dramaturgo, roteirista ou comunista alemão: que é realmente muito, mas muito triste que um artista precise de estátuas para se animar a criar.
É triste como enterro de criança que esta imprensa endividada precise de estátuas para ter o que dizer dos artistas embalados por modistas; e mais burro, duro ou triste do que isso é a educação artística de uma população que precisa de estátuas para se distrair da sua própria situação, que só não é parada como essa merda dessa estátua cobiçada porque a miséria mais fedida em que se agita essa massa é uma barbárie desgraçada de aflita...

É aqui mesmo, macacada, onde a molecada se arrasta como o Judas que é linchado por prefeitos tresloucados!É triste para caramba, para não dizer besteira numa terça-feira de trabalho!
É muito, mas muito triste ver um país de dedo em riste ou apontado para os gatilhos dos controles cair nessas armadilhas de propaganda charmosa, ou enganosa, e parar para ver passar um instante infeliz, gozando com a coisa da pompa do luxo alheio, apesar do lixo feio em que vivem mergulhados e amesquinhados.

Desculpem-me os que precisam de ilusão para viver e também os camaradas e companheiros dessas lidas, que demonizavam a dita estátua até pouco tempo atrás, mas que agora gostariam de tê-la, nem que fosse por um momento, entronizada num altar de suas salas decoradas com a boa e honesta renúncia fiscal.
Minha prezada classe profissional do bem-estar social: ela ainda é aquela estátua normal, aquela velha e boa estátua moral, como a dos cartazes antigos, com um sorriso malicioso apontado para as nossas caras: "I can't get no satisfaction..."
Politics, wars.
Do you remember, guys?

Aliás, nunca é mesmo demais lembrar que o melhor dessas estátuas talvez sejam os milhões de dólares, ienes ou eu- ros que elas trazem aos ganhadores.
Do bolso da genteConvém reiterar que só umas duas dúzias de cidadãos norte-americanos, mais ou menos americanos ou aceitos pela indústria cultural dos estadunidenses de um modo geral é que ganham a tal da estátua a cada ano e que tudo que eles ganham, de um modo ou de outro, sai do frouxo bolso da gente.

Quem pode pode; quem não pode agüenta as múmias e seus piores comentários críticos nas esforçadas traduções simultâneas.The Oscar goes to you, "bro"!

FSP 27 de fevereiro de 2007

23.2.07

Em tempos . . .

. . . de preguiça intelectual, segue uma letra de funk bem interessante retirada do blog do Pedro Alexandre Sanches

"alcatraz"(mc dandara sol)


"fazer média pro pobre na televisão
tu pode achar maneiro, doutor, mas eu não acho, não
desce do salto, segue a ladeira, sobe o morro
nem só de sonho vive um povo
vá, que alcatraz é lá
desce do salto, segue a ladeira, sobe o morro
vai ouvir o gemido do povo
vá, que alcatraz é lá
lá no morro a vida é sofrida, só deus intercede por nó
se nas noites de balas perdidas a dor sufoca nossa voz
vi lá no beco um menino caído, inocente, pagou pelo mal que não fez
no último tiroteio na minha favela morreram foi seis
dizem que o criador de alcatraz queria criar era uma grande senzala
pra que de lá o negro saísse, mas hoje, livre, o negro não se cala
pode me botar de cabeça pra baixo, de pernas pra cima, mas eu vou cantar
tenho carta de elforria, brasileira, guerreira, pronta pra lutar"

21.2.07

Será?

"A felicidade não pode nunca depender daquilo que não depende de você"

José Hermógenes de Andrade Filho, o professor Hermógenes

19.2.07

Escolha amor

O título do post não é um trecho de um diálogo no qual a mulher ou o homem diz para o parceiro(a) escolher alguma coisa. A intenção é equiparar as duas coisas: amor e escolha. Obviamente não é nenhuma novidade tentar falar sobre escolhas, muito menos sobre amor, mas depois de assistir Dolls, do Takeshi Kitano, sinto-me na obrigação de dizer alguma coisa, mesmo que não valha nada.

Apesar de ter dito que as sensações e interpretações podem ser precipitadas quando se assisti a um filme pela primeira vez, arrisco escrever algo sobre Dolls. A complexidade do amor já rendeu ótimo frutos, não só no cinema, mas também na música, literatura e por aí vai. Alguns autores conseguem "traduzir" o sentimento com maestria, outros nem tanto, porém, a maioria já fez ou tentou algo neste sentido.

Kitano consegue "explicar" de uma maneira única e impossível de ser entendida completamente por nós, ocidentais, o que é este sentimento. As sutilezas e metáforas presentes no filme são de uma sensibilidade incrível e não tenho certeza de que entendi tudo da maneira como o diretor pensou - se é que ele pensou em algo tão linear ou "explicável" assim. De repente a intenção fosse essa mesmo, deixar o espectador pensar sobre aquilo e chegar a conclusões únicas.

Seguindo a linha de não contar nada do filme, não vou dizer como tudo se passa, porém, a questão da escolha fica explícita em diversos momentos. Não sei se está certo, mas sempre achei que quando se ama de verdade, diferentemente do que a maioria das pessoas dizem, não fazemos concessões, e sim escolhas. Quando você deixa de fazer alguma coisa pela pessoa amada(o), está se escolhendo não fazer. De qualquer maneira é uma escolha.

E o diretor japonês consegue, pelo menos pra mim, demonstrar que essas escolhas - não importa se simples ou as mais complexas possíveis - têm um efeito eterno na vida de quem está envolvido na questão. Só que o grande mérito da película é fazer isso sem encher a tela de diálogos piegas, como muitos filmes ditos românticos fazem - vide as chamadas "comédias românticas" de róliude, principalmente aquelas com a Meg Ryan.

Com a utilização de imagens impressionantes e uma interpretação irretocável dos atores, o filme consegue transmitir a sua mensagem de uma forma bem diferente. Muitos não gostam do cinema japonês pelo fato de ser meio parado, com poucos diálogos em comparação com aquilo que estamos acostumados a ver, mas seria injusto negar a beleza e o talento destes diretores que utilizando "poucos recursos" conseguem fazer filmes ótimos.

Se de fato entendi tudo o que filme queria passar - se é que existe isso - não sei. Mas saí da sala satisfeito por ter visto uma verdadeira aula de sentimentos e efeitos de uma (ou mais) escolhas.

17.2.07

Adeus utopia

Como é bom rever um filme depois de algum tempo. De cara sempre rola umas emoções mais fortes, obviamente impulsionadas por aquilo que acabou de ser visto. Acho que nesses casos, muitas vezes a novidade acaba levando a interpretações equivocadas ou incompletas sobre aquilo que, de fato, o filme transmite.

Hoje tive a oportunidade de assitir novamente Adeus Lênin!, do Wolfgang Becker. A primeira vez, no cinema, foi impactante pelo discurso extremamente político, que continuo achando um dos mais interessantes em filmes sobre o sonho do socialismo. Porém, dessa vez, outro aspecto, não menos importante do que o político, saltou aos olhos.

Utlizando o contexto político como argumento, o diretor consegue deixar outra mensagem ou melhor, um questionamento "existencial": o que é a realidade ou a verdade? Não vou ficar contando os pedaços do filme para explicar os motivos pelos quais cheguei a tais conclusões, recomendo que assistam - com o perdão do clichê em "críticas cinematográficas".

Sem querer ser psicólogo demais ou entrar em discussões filosóficas, explicar uma realidade diferente para alguém que não conhece determinada coisa é muito difícil, mesmo que seja bem contextualizado e tudo mais. Já escrevi sobre isso aqui, mas não custa repetir: nunca digo aquela famosa frase: "Ah imagino como deve ser . . .". (caramba sempre quis colocar dois pontos depois de dois pontos e nunca consegui . . . espero que esteja certo!)

O filme retrata perfeitamente essa questão do que é real. Se você viajar com gosto, lembra até um pouco de Matrix . . . mas como prometi não contar nenhuma cena do filme, paro por aqui.

13.2.07

Cratera de informação

Alguém aí lembra da cratera do metrô? Pois é, depois de ocupar um espaço proporcionalmente igual ao do buraco, as notícias simplesmente sumiram da imprensa. Você viu alguma foto de lá depois que encontraram o último corpo, aquele que supostamente era traficante? Nem eu.

Não sei porque acontece isso e fico me perguntando até onde as notícias veiculadas de fato são de interesse público, como sugere a teoria jornalística. E como está a situação das famílias que estão impedidas de retornarem às suas casas por conta do perigo de desabamento? E mais, aposto que as construtoras responsáveis (Odebrecht, OAS, Queiroz Galvão, Carmargo Corrêa e Andrade Gutierrez) aproveitaram da "quentura" da situação e pagaram indenizações bem menores em relação ao que de fato os moradores têm direito.

Além disso, muito se falou dessas empresas e pouca coisa foi para frente. Todo mundo está cansado de saber que existe um monopólio - ainda que pareça estranho monopólio de cinco empresas "diferentes" - entre elas para todas as obras grandes no Brasil. Parece que só existem essas construtoras nas licitações públicas - bem duvidosas, diga-se de passagem.

Enfim, queria ao menos ver uma foto de como está a situação agora. Taparam o buraco? O tamanho é o mesmo, depois de tanta chuva, que era a principal preocupação quando o fato aconteceu?

12.2.07

Direitos (des) humanos

Você já foi roubado alguma vez? Não importa se levaram muito ou pouco, mas uma das piores sensações nestes casos é o sentimento de impotência diante do fato. Agora imagine uma situação onde o cara vai roubar uma mulher e ainda a estupra. Eu sinceramente não imagino o quão ruim deve ser para esta mulher, nem fazendo muito esforço para pensar sobre isso.

Para piorar a situação – se é que pode ser ainda pior – esse mesmo cara é foragido de uma penitenciária onde estava cumprindo pena por . . . estupro. Além disso, esse mesmo bom menino ainda é procurado por furto.

Por obra do destino esse mesmo rapaz é pego pela polícia e apanha até se cagar – literalmente. Os policiais só não o mataram por pouco, mas vontade não faltou.

Todos sabem que existem esquadrões da morte dentro das policias e que muitos inocentes morrem de graça. Mas, neste caso, matar é muito ou pouco para esse cara? Sinceramente não sei o que é pior. Sei apenas que as porradas dadas pelos policias não são suficientes para diminuir a dor da mulher atacada. Provavelmente nem a morte seria.

Se tinham o direito de bater? Não. Se é politicamente correto? Não sei. Se o filho da puta que estupra uma mulher e ainda tem coragem de ficar ligando para ela dizendo que foi gostoso e que está apaixonado, merece apanhar até se cagar? Sim.

Sou uma pessoa radicalmente contra qualquer tipo de violência, sobretudo a física. Mas, basta tentar (ainda que seja impossível esse tipo de coisa) se colocar no lugar da vítima para imaginar que umas porradas não são nada perto do trauma que vai ficar para o resto da vida.

Obviamente qualquer defensor dos direitos humanos vai dizer que por pior que seja o crime nada justifica a violência contra o acusado. Mas, será que esse pensamento seria mantido se essa mulher fosse mãe, esposa ou filha deste defensor? Acho difícil.

Por mais conscientes que sejamos em relação às convicções, quando o fato acontece conosco, acho impossível vencer a emoção pela razão.

Essa história do estupro é real, mas não aconteceu com nenhum parente nem conhecido meu, como possa parecer. Porém, serviu para minha imaginação viajar na questão dos direitos humanos.
Concordo que é necessário preservar a integridade física e tudo mais, só que neste caso, o acusado saiu ganhando por tudo o que já deve ter feito na vida.

Violência maior

Mais uma vez assistimos a um crime brasileiro* cuja repercussão principal é uma discussão nacional sobre a redução da maioridade penal. Um dos principais baluartes dessa causa foi o assassinato daquele casal de namorados que acampavam em São Paulo. Quando descobriu-se que o crime havia sido cometido por um “menino” de 17, todos foram às ruas para dizer que independentemente da idade, qualquer responsável por infringir a lei deve ir para a cadeia.

Sinceramente não tenho uma opinião bem formada sobre isso. Se é correto mandar um garoto de 15 anos, por exemplo, para uma penitenciária ou mesmo para uma “fundação de para o seu bem-estar” não sei. O que sei, ou melhor, penso que sei, é que deveria haver uma discussão muito mais ampla sobre a violência como um todo. O caso do João, preso no cinto de segurança do carro e arrastado até a morte, é triste mesmo, assim como o assassinato do casal e todos os outros crimes que acontecem diariamente pelas periferias do país.

Mas o caso não é único e muito menos o primeiro envolvendo “menores de idade”. Além disso, a idade nessas horas é o que menos conta, serve única e exclusivamente para a imprensa se aproveitar da questão e “chocar” a opinião pública de acordo com a linha editorial escolhida por cada veículo. Os motivos pelos quais ninguém discute a violência a sério não aparecem em nenhum jornal ou qualquer outro meio de comunicação.

Somente a discussão não vai levar a lugar nenhum, isso todos sabem. Porém poderia acontecer um aprofundamento das reflexões e que as questões colocadas resultassem em ações práticas em diversos âmbitos. Não sou guru e muito menos entendedor de qualquer assunto, mas penso que o princípio para de fato começar a mudar alguma coisa é as pessoas recuperarem o respeito pelo próximo – com o perdão do tom bíblico aqui.

Quando me refiro ao respeito, quero dizer em todas as esferas. Xingar alguém no trânsito, por exemplo, é uma agressão e, conseqüentemente, uma falta de respeito. Apesar de todos fazerem isso, não significa que seja o correto. Estou dizendo isso sem nenhuma pretensão de colocar um discurso politicamente correto e “certinho” mas as pessoas poderiam pensar um pouco mais sobre esse assunto.

Aposto que muitas vezes a violência nasce assim, sem nenhuma pretensão, e vai tomando proporções cada vez maiores e fora de controle.

*brasileiro = com requintes de crueldade, normalmente ocorrido em periferias e cometido por jovens viciados.
Fonte: sociedade brasileira.